segunda-feira, 7 de agosto de 2017

Tarô em Transe



Falemos de Cabala. Calma, não tomarei preciosos minutos do seu tempo falando sobre tabelas que você já conhece, encontráveis em dez mil livros e páginas da internet. Falo aqui de Cabala como cavalo alucinógeno que nos carrega ao longo das imagens e letras. Um dos sentidos de “Kabbalah”, em hebraico, é “receber”, então vamos pegar apenas isto da etimologia séria, e tragamos aqui para o nosso mundo fluido de delírios filológicos e etimologias imaginárias. Aqui Cabala é “cavalo” e “receber”, e também ser cavalgado, ser veículo de mensagens sagradas.
Cabala, assim com “c”, é um termo usado por Fulcanelli para um uso especial da linguagem, o uso de similaridades fonéticas e outras técnicas, para expandir a riqueza semântica das palavras e símbolos. Isto está profundamente relacionado com a Língua Verde, ou Linguagem dos Pássaros, dos alquimistas. Alguns, ao longo do tempo, chamaram isso de “Cabala Fonética”. Eu gosto muito deste termo, embora não goste de me limitar aos sons.
Sendo honesto com você, isso de combinar a forma das palavras, suas homofonias e rimas com etimologias reais e imaginárias visando expandir o campo semântico das palavras quer dizer uma coisa: cair em transe. Não um transe convencional, daqueles que geram dissociação total, verdade, mas ainda assim um estado peculiar de percepção, que vai sendo afiado com o tempo de uso, como uma espada. Em outro texto falaremos de espadas. Este estado de percepção nos permite “receber” mensagens, e enxergar coisas que não estavam ali antes. Isso pode nos levar a vermos o que não estava ali antes nas nossas vidas também, nos nossos problemas e questões. Trata-se de magia simpatética old school, e um tipo interessante de vidência, e como não se trata de um sistema, você pode aplicar a qualquer coisa, inclusive cartas de tarô. Não estou aqui falando apenas com profissionais da cartomancia, tampouco dando “dicas” que só servirão para os que leem cartas profissionalmente. Estou falando com toda e qualquer pessoa que deseje extrair mensagens de cartas de tarô. Também não estou colocando-me como inventor, estou aqui no máximo como transmissor, e nem sou dos melhores. Não sou um Senhor das Chaves Arcanas, estou mais para um amigo que no meio de uma partida de carteado diz, “ei! Sabem aqueles trocadilhos do tio José? Dá para ler cartas com eles!” Não se trata de inventar a roda, se trata de curtir a vertigem da rotação dos signos, e perceber as inusitadas formas que surgem quando as coisas se embaralham. Trata-se de dizer que ventilador é um aparelho mágico que sopra o nosso coração quando ele está ferido, com dor. Como aplicar a Cabala Fonética ao tarô? Bom, eu ainda estou descobrindo isso, mas o primeiro passo é ampliar a percepção para além da fonética, a abrir-se para todo tipo de rimas e ritmos que possam ser conectados. Por exemplo, você está diante de uma questão sobre o fim doloroso de um relacionamento, e a Roda saiu. A roda gira, o que remete a movimento, ciclos, e também tem associação com um instrumento de tortura, o que nos leva a dor, o formato da roda nos lembra do ventilador. A dor do consulente precisa ser ventilada. Se depois da Roda vem a Estrela, temos um moinho (moer, re-moer). Quem alimenta esta Roda? Este giro? Esta dor? Podemos responder estas perguntas com a terceira carta.
O baralho que mais dialoga comigo quando aplico este modo de leitura é o Tarot de Marselha. Eu realmente não sei ao certo se alguém criou estas imagens para funcionarem assim, digo, imagem por imagem. Existem migalhas no caminho para você encontrar respostas, Compagnonage, caleidoscópios, imagiers medievais, catedrais góticas, vitrais góticos, alquimia, Fulcanelli etc., o que percebi até agora olhando para as cartas, é que há um jeito de fazer imagens que simplesmente faz com que as conexões surjam. As simetrias, olhares, posturas, descontinuidades, incompletudes. Se você chegou até aqui com esperança de que este texto ficaria mais sério, acadêmico, ou “profundo”, sinto te decepcionar, tratam-se de divagações, e as divagações continuarão em outro texto. Por hora, se você quiser entrar em transe com o seu baralho, sugiro algumas coisas:

1.       1. Leia O Castelo dos Destinos Cruzados, de Ítalo Calvino, e logo depois de terminada a leitura, coloque 3 cartas em sequência, melhor que a primeira tenha uma figura humana, feche a sequência com um Arcano Maior, e escreva um conto à maneira dos contos do livro. Eu fiz isso na primeira vez que li este livro, até hoje não sei o que me deu aquele dia, mas passei a noite em claro escrevendo como um louco com as cartas diante de mim. Os contos não precisam ser obras primas, trata-se de um exercício.

2.      2.  Faça estes exercícios bolados por Enrique Enriquez, http://www.tarotforum.net/showthread.php?t=102599

3.      3.  Pratique este pequeno método para afiar os olhos, http://tarot-historico.com.br/?p=871

Isto não irá te fazer abandonar tudo que você acumulou até aqui, nem entrará em choque com nada na sua prática oracular, pois não se trata de um sistema. A sua caminhada e aprendizados são únicos e preciosos. Isto aqui só irá deixar tudo mais divertido, e irá afiará os seus olhos reais e imaginários. E por falar em afiar, no próximo texto, farei algumas aproximações entre o tarô e a poética agudíssima de João Cabral de Melo Neto. Mas não se esqueçam, serão apenas devaneios...

Hasta luego!
Hasta fuego!

Hasta Juego!

rafael medeiros

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Dobrar o ouro, ou ver dobrado unindo os olhos num ponto. Tentar refazer a mesma bolha, Transmigrar de globos. Ouro de bobo: seduz, mas s...